sábado, 5 de novembro de 2011

John Fante



“Uma noite, eu estava sentado na cama do meu quarto de hotel, em Bunker Hill, bem no meio de Los Angeles. Era uma noite importante na minha vida, porque eu precisava tomar uma decisão quanto ao hotel. Ou eu pagava ou eu saía: era o que dizia o bilhete, o bilhete que a senhoria havia colocado debaixo da minha porta. Um grande problema, que merecia atenção aguda. Eu o resolvi apagando a luz e indo para a cama.”

“O milagre aconteceu. Aconteceu assim: eu estava de pé à janela do meu quarto, observando um percevejo que rastejava ao longo do peitoril. Eram três e quinze de uma tarde de quinta-feira. Ouvi baterem à porta. Abri e lá estava ele, um estafeta dos telégrafos. Assinei o recibo, sentei-me na cama e pensei se o vinho finalmente acabara com o coração do Velho. O telegrama dizia: seu livro aceito enviando contrato hoje. Hackmuth. Era tudo. Deixei o papel flutuar até o tapete. Fiquei sentado ali. Então abaixei-me até o chão e comecei a beijar o telegrama. Rastejei para baixo da cama e simplesmente fiquei ali. Não precisava mais da luz do sol. Nem da terra, nem do céu. Simplesmente fiquei ali, feliz de morrer. Nada mais podia acontecer a mim. Minha vida havia terminado.”

“Olhei para os rostos ao meu redor e sabia que o meu era como o deles. Rostos drenados de sangue, rostos tensos, preocupados, perdidos. Rostos como flores arrancadas de suas raízes e enfiadas num vaso bonito, as cores se esvaindo rapidamente“.

Pergunte ao Pó



"Permaneci deitado na noite branca vendo o mau hálito escapar em pequenas nuvens. Sonhadores, éramos uma casa repleta de sonhadores. A vovó sonhava com sua casa na distante Abruzzi. O meu pai sonhava em ver-se livre das dívidas e empilhando tijolos lado a lado com seu filho. A minha mãe sonhava com a divina recompensa de um marido que não se ausentava de casa. Minha irmã Clara sonhava em tornar-se uma freira e o meu irmãozinho Frederick mal podia esperar para crescer e tornar-se um cowboy. Fechando os olhos eu pude ouvir o zumbido dos sonhos pela casa e então adormeci".

"Seus olhos saltaram de espanto. Eu o soltei e ele se virou e entrou no ônibus. Eu me afastei, cuspindo o gosto de óleo enquanto ele desaparecia na nevasca. Meti as mãos nos bolsos e comecei a subir a Pearl Street, afundado os pés a caminho de casa, debaixo daquela tempestade sem sentido. Mas a neve tinha suas vantagens, afinal. Ela nos escondia dos outros, escondia nossas sardas e orelhas de abano e a estatura ridícula, enquanto passamos pelos outros fantasmas daquela desolação, cabeças pendidas, olhos abaixados, nossa culpa e inutilidade bem protegidos lá dentro".

1933 foi um ano ruim


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