"Não é que a felicidade fosse insípida. É que ela não dava uma boa narrativa."
"Olhando em retrospecto, talvez eu ter dito que queria mais 'história' fosse uma forma de aludir ao fato de eu querer mais alguém para amar."
"Já reparou quantos filmes retratam a gravidez como uma infestação, uma colonização sub-reptícia? O Bebê de Rosemary foi só o começo. Em Alien um extraterrestre nojento sai da barriga de John Hurt. Em Mimic, uma mulher dá à luz um verme de sessenta centímetros. Mais tarde, o Arquivo X banalizou as cenas de alienígenas de olhos esbugalhados explodindo nauseabundamente da barriga de seres humanos. Nos filmes de horror ou ficção científica, o anfitrião é consumido ou despedaçado, reduzido a uma casca ou resíduo para que alguma criatura de pesadelo possa sobreviver."
"Achava o rosto do nosso filho esperto e contido demais; e a mesma máscara evasiva de opacidade me fitava de volta quando eu escovava os dentes."
"Com os anos, vi Kevin assistindo a decapitações, estripações, desmembramentos, empalações, crucificações, escalpos e olhos sendo arrancados e nunca o vi piscar um olho. Porque ele tinha sacado o macete. Se você não se identifica, o horror e a sanguinolência são tão desconcertantes quanto ver sua mãe preparando um estrogonofe."
"Ele deixava tarefas sem terminar não porque não conseguisse acabá-las, e sim porque conseguia."
"...depois de quase dezoito anos, faltando apenas três dias, posso finalmente anunciar que estou exausta demais e confusa demais e sozinha demais para continuar brigando, e, nem que seja por desespero, ou até por preguiça, eu amo meu filho. Ele tem mais cinco anos sombrios para cumprir numa penitenciária de adultos, e não posso botar minha mão no fogo pelo que sairá de lá no final. Mas enquanto isso, tenho um segundo quarto em meu apartamento funcional. A colcha é lisa. Há um exemplar de Robin Hood na estante. E os lençóis estão limpos".
Precisamos falar sobre o Kevin
"Dar alguma coisa a alguém exige coragem, já que inúmeros presentes são um tiro pela culatra. Um presente que destoe visivelmente das preferências de quem o recebe só faz deixar transparecer que o benfeitor não tem a mais remota idéia de quem seja essa pessoa. Por conseguinte, aparecer à porta com um embrulho pode ser mais arriscado do que chegar de mãos vazias. Não oferecer nada só traz o risco de fazer o sujeito parecer desatencioso ou sovina. Afoa a dádiva genérica de uma boa garrafa de bebida - e essa oferenda neutra tem suas próprias armadilhas, podendo parecer impessoal ou cautelosa demais - , qualquer presente implica o risco de expor quem o oferece como um idiota e de fazer a relação parecer uma caricatura."
"Esse amor era incomumente completo. Irina amava tudo em Lawrence, tal como ele era - inclusive sua rispidez com as outras pessoas, sua má postura, sua dependência da televisão, um vazio pernicioso que ela jamais conseguira preencher em todos aqueles anos de vida em comum. Ao mesmo tempo, sentia um relaxamento. O amor romântico é uma corda esticada e, em certos aspectos, uma luta, pois sempre nos debatemos, se não contra a pessoa amada em si, contra nossa própria escravização indigna a outro ser humano. Era possível que houvesse um tipo de amor diferente (...) Mas era igualmente possível que, enfim acolhendo Lawrence em sua totalidade, não mais batalhando contra as muitas deficiências que gostaria de corrigir, não mais se enfurecendo com os numerosos aspectos em que ele frustrava o ideal, Irina houvesse desistido dele".
O mundo pós-aniversário
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